No período entre as duas guerras mundiais
ocorridas no século passado, surgiu a teoria hipodérmica, a primeira a tentar
compreender e explicar o fenómeno da comunicação de massa e o seu efeito sobre
as pessoas.
Trata-se de um período histórico muito
conturbado, altura em que emergiram na Europa vários regimes absolutos
(Portugal, Espanha, Itália, Alemanha, União Soviética). Associado a alguns
destes regimes surgiram os primeiros fenómenos de comunicação em massa.
Também as democracias (Inglaterra,
França, Estados Unidos) tiveram necessidade, face ao esforço necessário para a
união das nações em torno de um objetivo, de recorrer à comunicação em massa.
É também por altura dos anos 20 do
século passado que se assiste à emergência de uma sociedade de consumo, sendo
certo que uma sociedade de consumo necessita de mecanismos de comunicação e
publicidade para promover os seus produtos.
Por esta altura assiste-se igualmente à
proliferação de meios de comunicação, sendo este facto, por um lado, causa, e
por outro consequência da massificação da comunicação.
A sociedade de finais do séc. XIX e
princípios do séc. XX estava também a sofrer grandes modificações motivadas
pelas consequências da industrialização e consequente afluência de pessoas às
cidades, o incremento no comércio, motivado também em parte pela massificação
da sociedade, a revolução nos transportes e a emergência de valores como a
igualdade e a liberdade.
As duas guerras mundiais vieram acelerar
ainda mais a revolução social em curso.
A teoria hipodérmica é precisamente a
resposta aos fenómenos referidos, por parte dos estudiosos. Em resultado da
análise e estudo desses fenómenos de comunicação em massa, surgem as primeiras
respostas e soluções para a criação de sistemas de comunicação de massas. Ou
seja, a necessidade conduziu à criação de uma ferramenta e o estudo levou ao
aprimoramento das ferramentas existentes.
É a partir desta altura que se encaram
os meios de comunicação como capazes e uteis para moldar opiniões e direcionar
as pessoas no sentido desejado pelo comunicador. A comunicação deve, no
contexto deste período histórico, ser entendida como forma de manipulação e
menos como forma de informação.
A teoria hipodérmica pode ser
caracterizada como uma abordagem global ao estudo dos media, não levando em
conta as especificidades de cada um. Da mesma forma entende que a reação
provocada pela comunicação é homogénea em todos os indivíduos, não dando
importância às diferenças entre cada um e não assumindo as diferentes formas de
perceção e cognição humanas.
Hoje sabemos que uma determinada
mensagem terá impactos diferentes em diferentes indivíduos, impactos esses
condicionados por diversos fatores socioeconómicos, culturais, entre outros. A
teoria em apreço considera uma massa como um grupo homogéneo de indivíduos,
ainda que provenham de diferentes ambientes sociais.
A teoria hipodérmica enfoca-se
essencialmente no tipo de estrutura social existente e na estrutura social dos
indivíduos, não dando relevância às especificidades próprias de cada um dos
indivíduos seguindo o que pensava Freud quando, a propósito das massas,
defendia existir uma “alma coletiva” que, de certa forma, inibia as
individualidades de cada um, à exceção dos afetos e dos instintos.
Partindo das premissas acima
referenciadas, a teoria hipodérmica procura estudar os efeitos dos media numa
sociedade de massas partindo dos princípios que, como já referi anteriormente,
as mensagens são recebidas de forma homogénea por todos e que as mensagens
surtem efeito instantânea e inevitavelmente porque provocam emoções que não são
controláveis pelos indivíduos.
Desta forma a comunicação em massa
transforma-se num veículo de domínio e controlo de sociedades que permite impor
correntes de pensamento e manipular as próprias emoções das pessoas. Por esta
ótica é possível compreender e enquadrar a propaganda exercida pelos vários
regimes, no período entre guerras, no sentido de motivar as pessoas para um
objetivo de união em torno de uma nação.
De salientar ainda que esta teoria
defendia que as sociedades industrializadas contribuíam para a alienação e
isolamento dos indivíduos, tornando mais fácil a sua manipulação.
Esta teoria está fortemente baseada, na
sua fundamentação psicológica, na teoria do behaviourismo. O behaviourismo defendeu,
na psicologia, a substituição do estudo dos processos mentais e a passagem ao
estudo dos comportamentos observáveis através de métodos científicos.
Comportamentos observáveis seriam então todos aqueles que partiam de um
estímulo exterior.
Os behaviouristas acreditavam no
paradigma de Pavlov de que a um determinado estimulo iria corresponder uma
determinada reação. Nesta perspetiva seria possível, através de estímulos,
obter reflexos condicionados.
O modelo comunicativo da teoria
hipodérmica segue este postulado. Nesta perspetiva, os mass media são agentes
que transmitem estímulos para o seu público, aos quais irão obter respostas
condicionadas pelo próprio estímulo.
A falta de relações interpessoais das
sociedades industrializadas contribuía ainda mais para o isolamento do
individuo e para a potenciação da resposta esperada perante o estímulo que lhe
era transmitido, ou seja, o isolamento dificultava o aparecimento de formas de
pensamento que contrariassem a reação condicionada esperada, induzida pelo
processo comunicativo.
Desta forma a teoria hipodérmica
pressupõe a existência de um estímulo-resposta indissociáveis. Os mass media
seriam a rede que controla esses estímulos em busca da resposta dos indivíduos.
Assim, a teoria hipodérmica defendia que
os meios de comunicação tinham toda a capacidade de controlo sobre o individuo,
relegando um pouco a importância do restante processo de comunicação e a forma
como o mesmo se desenrola.
O modelo de Lasswell vem, em 1948,
colmatar essa lacuna e aprofundar o estudo do modelo de comunicação. Finda a
análise, verificar-se-á existirem algumas oposições à teoria hipodérmica,
nomeadamente ao nível do resultado final do processo comunicativo.
No modelo de Lasswell é analisado o
processo comunicativo recorrendo à decomposição do mesmo em várias partes, que
se constituem como perguntas, nomeadamente: Quem? Diz o quê? Através de que
canal? A quem? Com que efeito? Esta decomposição aparece um pouco em
contraponto com o paradigma da teoria hipodérmica onde as perguntas são: Quem
obtém o quê? Quando? De que forma?
Da análise das questões acima resulta a
evidencia que Lasswell confere importância ao sujeito, situação que não
acontecia com a teoria hipodérmica. Na teoria hipodérmica existia um emissor
que em determinado tempo obteria uma determinada reação utilizando um método.
No modelo de Lasswell o efeito que determinada mensagem produz já depende do
recetor, que deixa de ser uma entidade abstrata, passando a ser alvo de estudo.
Neste caso, abandona-se a ideia de que
os indivíduos são simples peças que se encaixam para formar uma sociedade,
desprovidos de pensamento próprio e indefesos contra a mensagem veiculada pelos
media.
Essencialmente o modelo de Lasswell e a
teoria hipodérmica diferem na importância que é dada ao individuo. De resto
ambas acreditam no poder dos media para submeter as massas e orientá-las num
determinado sentido.
Também Lasswell acredita que os fracos
vínculos sociais decorrentes das sociedades modernas são uma fraqueza que
permite uma maior penetração das mensagens, especialmente as de cariz
emocional.
Lasswell não será um completo opositor
da teoria hipodérmica, será, isso sim, alguém que aprofundou uma teoria em que
acreditava e que considerava incompleta. A importância dada ao recetor no seu
modelo é prova disso mesmo.
Analisando o paradigma de Lasswell
verifica-se que as variáveis Quem? Diz o quê? Através de que canal? A quem? Com
que efeito? compreendem, cada uma, um setor da pesquisa, desde o estudo dos
emissores, do conteúdo, do controlo do que é difundido, do destinatário das
mensagens e, finalmente, do efeito
provocado.
As teorias
da comunicação evoluíram muito desde a formulação da teoria hipodérmica e do
modelo de Lasswell. Contudo, em minha opinião, o avanço que constituiu o modelo
de Lasswell em relação à teoria hipodérmica, constitui ainda hoje, a base do
entendimento do ato de comunicar e terá certamente servido de base a outras
teorias que se seguiram.
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